quinta-feira, 31 de março de 2011

31/03/2011 17:08:37

Apoio à produção e ao acesso a alimentos: lições do Brasil


Darana Souza y Danuta Chmielewska, do Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo
Abordagens que combinam o acesso a alimentos para os segmentos mais vulneráveis da população com o apoio à produção de gêneros alimentícios por agricultores familiares podem trazer benefícios significativos para o combate à fome e à pobreza. O mercado institucional pode desempenhar um papel importante nestas abordagens, garantindo, por um lado, alimentos para doações, e, por outro, uma oportunidade de mercado para os agricultores que de outra forma teriam dificuldade em estabelecer relações comerciais vantajosas. As vantagens geradas por estas abordagens podem ser significativas quando as estratégias de aquisição são executadas considerando a produção local e os padrões locais de consumo. O Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA) pode trazer lições importantes a serem debatidas neste contexto. O PAA é uma ação estratégica da política nacional de segurança alimentar do país conhecida como Fome Zero. O objetivo do Programa é garantir acesso a alimentos para populações que vivem em insegurança alimentar e nutricional, bem como promover a inclusão social nas áreas rurais. Desde sua implantação em 2003 até dezembro de 2008, o governo federal já destinou R$ 2 bilhões para a execução do PAA, resultando na aquisição de cerca de 2 milhões de toneladas de alimentos. Em 2008, um total de cerca de 120 mil agricultores vendiam seus produtos ao PAA, que foram doados para 16,8 milhões de pessoas (CONSEA, 2009). Duas modalidades do Programa – CDLAF e CPR-Doação – facilitam as aquisições por parte do governo para distribuição de diversos produtos agrícolas.
A aquisição dos produtos é feita com dispensa de licitação, garantindo este mercado aos agricultores familiares beneficiários do Programa. As duas modalidades referidas são capazes de fornecer uma ampla gama de alimentos para instituições locais, tais como associações de bairro, creches e hospitais. Ao fazê-lo, as populações locais podem ter acesso gratuito aos alimentos distribuídos.
Um estudo de caso no Nordeste do Brasil mostra que tais modalidades do Programa representam ao mesmo tempo uma oportunidade comercial decisiva para os agricultores familiares, na medida em que apoiam importantes mudanças em suas práticas produtivas e organizacionais, bem como uma estratégia crucial para garantir oferta adequada de alimentos (Chmielewska e Souza, 2010).
O estudo afirma que, para os agricultores familiares, a oportunidade de mercados seguros com preço garantido os encoraja a reinvestir em sua produção e otimizar recursos existentes. Este processo leva a um maior uso de insumos e de mão de obra, à diversificação da produção e a um maior controle de qualidade.
A melhoria da qualidade de produtos pode ser atribuída ao controle imposto pelo Programa e ao compromisso dos agricultores em entregar produtos satisfatórios para os beneficiários locais. As organizações de agricultores também se fortaleceram por meio do PAA, o que pode ser ilustrado pela regularização da sua condição jurídica, pelo aumento do número de membros e pela maior capacidade de gestão de projetos.
O PAA tem ainda facilitado a disponibilidade de uma diversa gama de alimentos que respeitam os hábitos alimentares locais para aqueles que se beneficiam das doações proporcionadas pelo Programa. Além disso, o PAA foi apontado como incentivador da produção e do consumo de alguns alimentos que estavam sendo abandonados, como diferentes variedades de mandioca.
Como qualquer programa deste tamanho e complexidade, os desafios são os mais diversos. O estudo revela que ainda é necessário maior acesso dos agricultores a ações complementares, a exemplo de assistência técnica para o planejamento da produção. Isso é justificado pela capacidade limitada de produzir os tipos de produtos e as quantidades especificadas pelos agricultores nos projetos do PAA. Além disso, intervalos entre os projetos têm causado dificuldades consideráveis para alguns agricultores, afetando sua renda e o fluxo de mercadorias para os beneficiários das doações.
Considerando a exposição acima, concluímos que o mercado institucional pode ser uma ferramenta relevante de apoio à estratégia de produção e acesso a alimentos. A experiência brasileira tem demonstrado o potencial de benefícios para produtores e consumidores, maximizado pela promoção de produtos diversificados que podem ser consumidos localmente. Neste contexto, as relações de compra e distribuição combinadas com programas de apoio fornecem uma oportunidade significativa para melhorar as capacidades de inserção no mercado dos agricultores e para produzir benefícios à comunidade como um todo.

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